quarta-feira, 14 de novembro de 2007

Brasil processualiza falência, EUA apenas administra

por Jorge Queiroz
Inúmeros aspectos marcaram a visita dos 10 juizes federais americanos ao Brasil, entre os quais: que apesar das LRFs do Brasil e EUA estarem alicerçadas em idêntico espírito, ou seja, o da preservação das empresas economicamente viáveis, são dispares no que tange a observação de aspectos relacionados a praticidade e celeridade judicial. Enquanto no Brasil a recuperação e a falência são extremamente processualizadas nos EUA são administralizadas, focadas na negociação e em tornar o processo o mais fluido possível — um sistema onde idealmente as partes decidem seus próprios desígnios.

O Instituto Brasileiro de Gestão e Turnaround (IBGT), a Associação Paulista de Magistrados e a Associação Americana de Juizes de Recuperação e Falências realizaram o primeiro e pioneiro Colóquio Internacional de Magistrados de Recuperação e Falências na Apamagis em 22 e 23 de setembro de 2007.

Foi sucedido pelo V Fórum Internacional de Renovação de Empresas em 24 e 25 de setembro e transmitido pela internet para todo o mundo, realizado pelo IBGT com o apoio do American Bankruptcy Institute onde mais de 50 dos maiores experts brasileiros e internacionais, cujas experiências constituem um verdadeiro arsenal de estratégias práticas e técnicas criativas, participaram dos debates de questões relacionadas a prevenção de crises, renovação e recuperação de empresas incluindo a lei de recuperação e falências (LRF), distressed finance e investimentos.

Magistrados de diferentes partes do Brasil e dos EUA participaram de uma série de workshops para analisar os problemas práticos em administrar diferentes casos sob a LRF inclusive aqueles envolvendo múltiplas jurisdições, aumentando assim o nível de entendimento e cooperação entre Cortes de Justiça.

Inúmeros aspectos marcaram a visita dos 10 juizes federais americanos ao Brasil, entre os quais: que apesar das LRFs do Brasil e EUA estarem alicerçadas em idêntico espírito, ou seja, o da preservação das empresas economicamente viáveis, são dispares no que tange a observação de aspectos relacionados a praticidade e celeridade judicial. Enquanto no Brasil a recuperação e a falência são extremamente processualizadas nos EUA são administralizadas, focadas na negociação e em tornar o processo o mais fluido possível — um sistema onde idealmente as partes decidem seus próprios desígnios. Observou que o código de recuperação e falência americano carrega em si o espírito de prover uma segunda chance conforme o artigo 1º da constituição americana.

Nos EUA a ênfase está na cooperação, comunicação, na mediação, no ganho do crescimento. Incentiva a mediação e que as próprias partes negociem uma solução. Já no Brasil temos por tradição um direito punitivo. Recuperação não se faz com base em litígio. A nova lei de recuperação brasileira demanda uma postura diametralmente oposta da forma jurídica que vínhamos tratando.

Um dos aspectos mais marcantes observados é que a corte de recuperação americana funciona 24 horas por dia, 365 dias por ano. Existem certas questões que surgem quase que imediatamente: relacionadas a trabalhadores, instalações, alimentação de animais, fornecimento de matéria prima. Existe toda uma consciência, cultura, abrangente e dinâmico aparato juridico e financeiro voltados para a manutenção da atividade produtiva como: audiências emergenciais até mesmo por conferência telefônica; utilização de e-mail; informatização; internet; conceito do chamado “primeiro dia do processo”; da doutrina da necessidade; decisão provisória; mercado de créditos extraconcursais com garantia real; mercado secundário de compra de créditos; sistemática de maximização do preço de venda de ativos ou de todo o negócio.

Tal qual nos EUA a lei brasileira prevê também a criação do comitê de credores com a dramática diferença de que nos EUA o comitê de credores quirografários pode efetuar contratação de profissionais para assessorá-lo. Esses profissionais e empresas são pagos pelo devedor ou pela massa falida, fato que não ocorre no Brasil.

Há características na lei americana que possibilitam que a aplicação da LRF seja efetiva. Partes são encorajadas a negociar para evitar uma decisão adversa do juiz. O papel do juiz nos EUA é o de resolver controvérsias. Nada pára o processo recuperatório nos EUA enquanto no Brasil qualquer recurso interrompe o bom andamento do processo, fato extremamente grave.

Nos EUA existe grande ênfase na celeridade. O litígio ocorre em tempo real, sendo resolvido prontamente na medida em que surge e não litígio de autópsia. Demanda criatividade das partes envolvidas. Maior parte do trabalho ocorre fora do juízo para assegurar a continuidade da atividade da empresa: negociações; gestão de crise; elaboração do plano; valorização; precificação; alternativas; onde cortar custos e aumentar receitas; busca de novos recursos; reuniões entre advogados e clientes.

Sob a ótica da corte americana existem fatores essenciais para proteger as empresas e a continuidade de negócios; um deles é a transparência do processo para todos participantes. Outro objetivo é o atendimento breve a todos; necessidade de rápida mobilização. A lentidão leva uma empresa que poderia ser salva a sucumbir.

Os juizes americanos observaram que o principal desafio para se obter a efetividade da LRF é estabelecer um contrato social entre as partes. O entendimento de que apesar das diferenças, deve haver um espírito de cooperação. Sem as partes cederem torna a solução muito complicada.

Dado o curto espaço de tempo na LRF Brasileira para propor e aprovar o plano, o papel do Administrador Judicial pode tornar-se extremamente importante. Este é o órgão responsável pela contratação de profissionais, incluindo especialistas para apurar o valor do negócio; é o órgão que pode dar foco a todas as partes de uma forma objetiva para se chegar a uma solução de reestruturação e de negócios. É, da mesma sorte, o órgão que o juiz pode pressionar, promover e proteger para executar o trabalho.

Foi observado que sob a LRF Brasileira o juízo necessita exercer de maior flexibilidade em observância ao espírito do novo diploma recuperatório legal e o princípio a equidade, prática esta, bastante sedimentada nos EUA. Um desses casos aplica-se a distribuição de ativos entre o universo de credores, não sendo necessário aguardar a decisão final de todas as impugnações ou fechar o quadro geral de credores. Não se pode prejudicar toda uma maioria em razão que questionamentos efetuados por uma minoria, em alguns casos até de má fé, cujas impugnações impõem um atraso forçado a todo o processo, causando grandes danos ao universo de credores ou pondo em risco a recuperação da empresa.

O juízo pode trabalhar (a) com a estimativa do valor envolvido as impugnações para certos propósitos e a partir disso (b) meramente estipular uma reserva, sem que todas as contestações sejam decididas judicialmente, ou seja, fazer uma provisão parcial para esses processos em andamento, mas sem penalizar a maioria, o universo de credores, retendo a totalidade dos valores ou ativos ou retardando a confirmação do plano recuperatório até que todas as impugnações sejam decididas.

O Brasil vive ainda o dilema do “quem manda mais”, o juízo universal da recuperação e falência, a justiça do trabalho ou a justiça tributária. Há ainda o grave problema da exigência da certidão negativa de impostos e o fato do fisco ficar fora do alcance da recuperação judicial. Nos EUA resta claro que o juízo da recuperação e falência é realmente universal e soberano sem qualquer conflito de competência entre diferentes justiças.

Outro aspecto contrastante é o de que nos EUA é comum o pedido voluntário de recuperação ou falência. No Brasil, nos casos de falência, predomina o pedido involuntário; em São Paulo de 500 pedidos de falência apenas 1 é voluntário. No Brasil a empresa em crise ainda carrega o estigma de fracasso, morte. Falência para o brasileiro significa derrota. É comum o empresário no Brasil deixar exaurir seu patrimônio até que não tenha mais solução.

Deve-se agir para que esse estigma que recai sobre as empresas em dificuldades seja eliminado. Sem embargo, esse objetivo apenas será alcançado quando existir uma imediata investigação por fraude associada a todos os pedidos de recuperação e falência, e que os promotores de justiça deixem claro que eles irão concluir suas investigações prontamente caso não haja suspeita de fraude. Que em havendo a fumaça do bom direito o pressuposto seja o da boa fé, e não generalizar que haja suspeita em todo e qualquer pedido de recuperação e falência.

Como observado nos EUA, é vital fazer o público entender que o negócio pode merecer viver. No famoso caso da WorldCom a direção foi substituída e a empresa recuperada — continua sendo a 2ª maior empresa de telecomunicações do mundo. Lá existem empresas especializadas em investir em empresas em crise da mesma forma que em empresas saudáveis e os juizes têm de ter essa sensibilidade.

Para que a nova lei tenha êxito, a mudança mais crucial necessária é a introdução de um processo de mudança, originado, em primeiro lugar, pelos advogados e outros profissionais que atuam na área de recuperação e falência no Brasil. Os juízos podem facilitar essa mudança ao estimular a negociação e desencorajar a mentalidade de litígio.

É igualmente necessário que se abdique da visão do juiz de ontem, expressa no passado; do judiciário intervencionista, que não consegue solucionar as controvérsias; adoção de medidas que voltadas para coibir aquelas iniciativas que visem imputar morosidade e falta de efetividade ao processo. Entender que não se podem regular situações futuras com o passado, que negócios não são questões que podem ser resolvidas com visão do passado, e que devem obrigatoriamente ser resolvidos em tempo real.

Os juizes, advogados, devedores, credores, trabalhadores brasileiros devem adaptar-se a nova realidade, atuando com os olhos de amanhã. Abandonar a mentalidade onde o protagonista é o processo e a resolução do conflito secundária; extinguir a cultura procrastinatória de alongar o processo o máximo possível com recursos e agravos para ganhar tempo, que tem efeitos letais sobre a recuperação e maximização de valor.

Nos países desenvolvidos apenas 10% dos casos vão para a mão dos juizes; grande massa de conflitos se encerra antes do processo.

No caso de recuperação judicial da empresa Delphi em andamento nos EUA haviam dezenas de milhares de contestações, mas, em razão dos procedimentos de administração de contestações judiciais que demandam total exposição, mediação e prontas datas de audiência, apenas meia dúzia de processos foram decididos pelo juízo.

Observamos, no entanto, o inicio de um processo de mudança cultural no Brasil. O Tribunal de Justiça de SP, detentor de 49% dos processos da nação, seguindo uma tendência mundial, está implantando um projeto de conciliação e mediação que visa trazer as partes de volta a mesa de negociação, coisa que não acontece mais em outra justiça estadual no Brasil, face a alteração legislativa de 1994 que retirou sua obrigatoriedade. Um projeto que objetiva a pacificação da controvérsia sem a imposição judicial, através da busca de acordo onde a possibilidade de cumprimento espontâneo é bem superior a 90%, além de atender ao princípio da celeridade, aspecto vital nos casos de recuperação e falência. Dessa forma, evita-se uma decisão judicial obtida ao final de 20 anos, após o transito em julgado quando se busca a execução forçada, fato que impõe custos e perdas proibitivas a toda a sociedade.

Ainda na linha da conciliação, no Fórum João Mendes em São Paulo, o maior da América Latina, existe uma massa real de 400 mil processos tramitando permanentemente, sem considerar as Varas de Família. Nesse projeto, em menos de três anos de seu inicio, 7 mil títulos judiciais definitivos foram homologados através da conciliação. O índice de acordo na esfera processual é ainda pequeno. Passou de 7% na fase inicial para 25% atualmente. A empresa recordista de processos obteve um índice de 63% de acordos nos processos judiciais e a partir de parcerias junto às concessionários, órgãos de defesa do consumidor, e grandes litigantes, são realizadas uma média de 4 mil audiências de conciliação por mês. O índice de acordos na esfera extraprocessual já alcança a marca de 86%, fato bastante animador.

O colóquio de magistrados também abordou a importância do Brasil introduzir a mudanças legislativas necessárias com o objetivo de adotar a lei modelo das Nações Unidas no que tange insolvências transnacionais. Os EUA aderiram aos princípios da lei modelo que estão contidos no Chapter 15 da lei americana e vários outros países fizeram o mesmo.

Em 2005 a lei de recuperação americana foi modificada para incluir pequenas empresas; desonerando os custos de recuperação judicial para as pequenas empresas. A pequena empresa não recebeu a atenção adequada na lei de recuperação brasileira. Os juizes americanos observaram que o sentimento no Brasil com relação a nova LRF é de que pessoas ainda não se acostumaram. Comentaram que este é um processo de evolução, destacando que assim como nos EUA onde as pequenas empresas ainda estão se acostumando com a recente reforma da lei de recuperação americana, demorará um pouco no Brasil para que todos abracem a nova LRF.
Revista Consultor Jurídico, 13 de novembro de 2007
Sobre o autor
Jorge Queiroz: é especialista em recuperações de empresa e presidente do Instituto Brasileiro de Gestão e Turnaround. É também representante junto a Insol International e membro do American Bakruptcy Institute.

terça-feira, 13 de novembro de 2007

Ativos da BRA não cobrem suas dívidas



Balanço da BRA entregue à Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) mostra que no final de 2005 a companhia tinha um ativo permanente de R$ 9,7 milhões, valor muito inferior às suas dívidas. Trabalhadores entraram nesta quarta e quinta-feira com ações pedindo o bloqueio de bens da companhia aérea para garantir eles que sejam pagos. Segundo fontes da empresa ouvidas pela reportagem, hoje o valor dos ativos permanentes da companhia não passa de R$ 10 milhões. A BRA tem uma dívida com bancos e fornecedores que soma cerca de US$ 100 milhões e 70 mil passagens vendidas até março no valor de R$ 22 milhões. Se as demissões dos 1.100 funcionários forem efetuadas, a empresa terá que pagar cerca de R$ 7 milhões. O diretor da BRA Danilo Amaral afirmou que, se não conseguir novo aporte financeiro, a empresa irá avaliar a possibilidade de entrar em recuperação judicial. A companhia aérea tinha um contrato de seis meses com a consultoria americana Alvarez & Marsal, que já cuidou da reestruturação de companhias aéreas como a US Airways e a Aeroméxico, mas ele venceu na semana passada. Os consultores, entretanto, continuam se reunindo com representantes da empresa aérea para analisar a sua situação financeira. "Vamos avaliar essa possibilidade [de recuperação judicial] se não tivermos caixa", afirmou Amaral. Sem conseguir capital de giro (os fundos de investimento que aportaram dinheiro na BRA em 2006 se recusam a fazer novo aporte), a companhia pediu a suspensão de suas operações à Anac na última terça. Desde então, vem enfrentando outros problemas: uma empresa de leasing já entrou com uma ação na Justiça dos EUA cobrando parcelas atrasadas de aviões e pode entrar com pedido de arresto das aeronaves. Toda a frota da empresa, de dez aviões, é alugada. Segundo a reportagem apurou, os imóveis usados pela companhia também são alugados. Em geral, o valor dos ativos permanentes de companhias aéreas é baixo, já que é comum a frota ser composta de aviões alugados. A BRA, que em setembro possuía 4,6% dos vôos domésticos, fazia 26 rotas nacionais e 3 internacionais. Atualmente, a BRA sonda fundos de investimento na tentativa de encontrar um novo interessado em capitalizar a empresa. A avaliação de especialistas é que a companhia dificilmente voltará a operar. Bloqueio
Na quarta-feira, o Simarj (Sindicato dos Trabalhadores nas Empresas de Transporte Aéreo do Município do Rio de Janeiro) entrou com uma ação civil pública no Tribunal Regional da 2ª Região pedindo o bloqueio da conta corrente da companhia, das suas aplicações financeiras e de bens que se encontram nos aeroportos Santos Dumont e Tom Jobim, no Rio. A BRA deu aviso prévio para 1.100 funcionários, e o objetivo da ação é garantir o pagamento. Nesta quinta-feira, a FNTTA (Federação Nacional dos Trabalhadores em Transporte Aéreo) também ingressou com uma medida cautelar pedindo o bloqueio de contas da BRA, das filiais da empresa e também dos bens dos administradores da companhia. "Chegou ao nosso conhecimento que a companhia tinha dez aviões, seis deles em leasing e quatro sob o domínio da BRA", afirma Mário Caliano, advogado dos sindicalistas. Amaral nega que os quatro aviões sejam da BRA. "Os funcionários vão receber. Estamos focados em arranjar mais dinheiro para a companhia sobreviver. Esse tipo de ação só piora a situação", afirmou. "Nós acreditávamos que iria haver demissões, mas não nesse nível. E ninguém achava que ela ia pedir suspensão de rotas. É hipotético, mas acreditamos que possa ter sido uma manobra para pressionar o governo e os fundos para que ajudem a companhia", disse o presidente da FNTTA, Uébio José da Silva.

Fonte: Folha News

Empresa em recuperação judicial também paga depósito recursal

As empresas em processo de recuperação judicial, liquidação extrajudicial ou concordata preventiva, por não perderem totalmente sua capacidade financeira e de gerenciamento, como ocorre na falência, não estão isentas do preparo recursal no que diz respeito ao depósito prévio previsto pelo artigo 899 da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho).Sob esse fundamento, a 1ª Câmara do TRT (Tribunal Regional do Trabalho) da 15ª Região negou provimento a agravo de instrumento em recurso ordinário interposto por duas empresas de implementos agrícolas, uma delas em recuperação judicial. As reclamadas agravaram contra despacho do juiz da Vara do Trabalho de Matão, município da região de Araraquara. O magistrado negou seguimento aos recursos ordinários das empresas, porque elas não fizeram o depósito recursal. No agravo, a primeira reclamada alegou o fato de estar em processo de recuperação judicial, enquanto a segunda argumentou que também se encontra em situação difícil, após passar por uma concordata preventiva. Em seu voto, seguido unanimemente pelos demais integrantes da Câmara, o juiz Luiz Antonio Lazarim, relator do acórdão, ressaltou que é possível dispensar a pessoa jurídica, quando comprovada sua insuficiência econômica, do pagamento das custas processuais, conforme prevê o artigo 5º da Constituição Federal. O mesmo princípio, porém, advertiu o magistrado, não se aplica ao depósito recursal, cuja finalidade consiste na garantia do juízo. "A gratuidade da justiça não afasta o dever de recolhimento do depósito recursal, que tem natureza diversa das custas processuais, e destina-se a garantir o recebimento do crédito reconhecido em sentença", lecionou o juiz Lazarim. O relator ponderou, reforçando sua argumentação, que a justiça gratuita é um benefício concedido normalmente ao empregado, em razão de sua condição econômica em geral difícil. Só excepcionalmente, observou o juiz, a isenção é estendida ao empregador, "quando devidamente comprovada a insuficiência financeira". Quanto ao depósito recursal, no entanto, o magistrado assinalou que mesmo o fato de a primeira agravante se encontrar em processo de recuperação judicial não a exime do dever de depositar, possibilidade cabível apenas a massas falidas. Esse entendimento, lembrou Lazarim, já foi inclusive consolidado pela Súmula 86 do Tribunal Superior do Trabalho (TST): "Não ocorre deserção de recurso de massa falida por falta de pagamento de custas ou de depósito do valor da condenação. Esse privilégio, todavia, não se aplica à empresa em liquidação extrajudicial."

Domingo, 11 de novembro de 2007

Polícia prende 12 acusados de dar golpe da empresa falida

Em três anos, os suspeitos movimentaram cerca de R$ 15 milhões

SÃO PAULO - Doze pessoas foram presas nesta quarta-feira, 2, na “Operação Viveiro”, da Polícia Civil e da Receita Federal, acusadas de participar de uma quadrilha especializada em sonegar impostos com atuação nos Estados de São Paulo e Mato Grosso do Sul. Os envolvidos abriam empresas, pegavam empréstimos, compravam mercadorias, pediam falência e fechavam as portas.
Em três anos, os acusados movimentaram cerca de R$ 15 milhões. Com eles foram aprendidos R$ 100 mil em dinheiro, duas Mercedes-Benz e um Audi, uma pistola, uma carteira funcional da Polícia Civil e computadores. As investigações começaram em junho de 2006.
“Um órgão do Ministério da Fazenda entrou em contato conosco para que investigássemos uma empresa da nossa região que tinha uma movimentação financeira que não condizia com o seu porte”, disse o delegado-seccional Erasmo Pedroso Filho.
Durante as investigações, os policiais descobriram que a quadrilha era liderada pelo argentino Cláudio Daniel Mussa, de 50 anos. Ele mora há 17 anos no Brasil. O argentino foi preso em sua casa em Praia Grande, no litoral sul. Ele estava com sua mulher, Rosana Dias da Silva, de 28 anos, que, segundo a polícia, também faz parte da quadrilha.
O acusado, de acordo com a polícia, chefia 13 empresas que atuavam no ramo de comercialização de plástico industrial. “Dessas empresas, três são verdadeiras e seriam o destino do dinheiro e mercadoria adquiridos em empresas de fachada”, disse Pedroso Filho.
As investigações avançaram quando a Justiça autorizou escutas telefônicas para investigar os suspeitos. Havia ramificações da quadrilha na Grande São Paulo (Taboão da Serra, Juquitiba, São Lourenço da Serra e Santo André), no litoral (Praia Grande), no interior (Vale do Paraíba), além da cidade de Campo Grande (MS).
Noventa policiais foram para essas cidades cumprir 12 mandados de prisão temporária (de cinco dias, podendo ser renovado) e 20 de busca e apreensão. De acordo com a polícia, entre os integrantes da quadrilha havia funcionários de banco. Eles teriam a função de facilitar e liberar empréstimos para as empresas fantasmas. Outra forma de driblar o pagamento de impostos era com o repasse de mercadoria de um Estado para o outro. Outros envolvidos no esquema foram identificados e deverão ter a prisão temporária requisitada. Outro passo das investigações é periciar os computadores e documentos apreendidos nos imóveis e escritórios dos acusados.

Falência da Transbrasil baseou-se em dívida quitada

A Justiça paulista concluiu, finalmente, depois de cinco anos, que a dívida de US$ 2,7 milhões invocada pela General Electric para tirar a Transbrasil do ar já havia sido paga. A multinacional, segundo a decisão de primeira instância, deverá indenizar a companhia aérea brasileira pelos prejuízos que provocou.
O escritório que representa a empresa, o Teixeira, Martins e Advogados, já está providenciando as petições que encaminharão a decisão ao TJ paulista, ao Superior Tribunal de Justiça e ao Supremo Tribunal Federal, onde outros aspectos da mesma causa estão em apreciação.
A decisão, publicada nesta quinta-feira (3/5), é do juiz Mário Chiuvite Júnior, da 22ª Vara Cível de São Paulo. Com base na perícia, o juiz declarou que a Transbrasil pagara também outras seis notas promissórias cobradas pela GE em processos de execução. O juiz afirma na sentença que ficou provado que a empresa pagou US$ 21,9 milhões para saldar uma dívida total de US$ 19,6 milhões. Ou seja, pagou mais do que devia.
A reviravolta se deve ao fato de o processo de falência ter andado mais rápido que o processo sobre a validade da cobrança, que encalhou em São Paulo — provocando a inadimplência da Companhia.
“A General Electric causou danos enormes à Transbrasil, inviabilizando a Companhia e responderá por isso”, afirma o advogado Roberto Teixeira, para quem a companhia aérea poderia estar voando normalmente, não fosse a cobrança indevida.
A sentença confirma: “Constata-se que o protesto respectivo realizado em detrimento da autora foi indevido, o que certamente acarretou danos a esta última, na forma estabelecida no artigo 1.531 do Código Civil., asseverando-se que tal apontamento indevido causou sérios prejuízos à parte autora, tais como a necessidade de formular a caução respectiva, risco iminente e infundado de ter títulos protestados indevidamente, além de sério abalo de crédito”.
No final, a sentença, além de declarar a inexistência da dívida, também condenou as empresas do Grupo GE “a pagarem à autora, a título de reparação por perdas e danos, nos termos do artigo 1.531 do Código Civil, os prejuízos causados a esta última, valor que deverá ser apurado em liquidação por arbitramento”.
A decisão poderá representar, na prática, a assunção de todas as dívidas da Transbrasil geradas após a paralisação de suas atividades, inclusive trabalhistas e tributárias, pela GE, além de indenização aos acionistas pela derrocada de uma empresa que detinha 20% do mercado, aproximadamente, quando foi requerida a sua falência.
Procurada por meio de sua assessoria de imprensa, a GE afirmou que não foi notificada e não comentou a decisão.
Histórico
As divergências entre as empresas começaram quando um avião operado pela Transbrasil passou por um incidente de aquaplanagem em Porto Alegre. A GE pedia na época que a empresa reconhecesse a perda total da aeronave a fim de poder receber o valor total do seguro. Como a Transbrasil se negou a satisfazer a GE, esta ingressou com o pedido falimentar utilizando-se de um título já pago, além de cobrar outras dívidas igualmente pagas.
A GE também está sendo investigada pela 1ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro por haver votado pela falência da Varig com base em créditos que ela já havia vendido a terceiros. Os seus representantes e advogados, de acordo com manifestação do Ministério Público do Rio de Janeiro existente nesse processo, deverão responder criminalmente pela conduta praticada.
A conduta da GE, no caso da Transbrasil, já foi declarada criminosa durante em relatório final apresentado pela CPI do Banestado.
A Justiça paulista concluiu, finalmente, depois de cinco anos, que a dívida de US$ 2,7 milhões invocada pela General Electric para tirar a Transbrasil do ar já havia sido paga. A multinacional, segundo a decisão de primeira instância, deverá indenizar a companhia aérea brasileira pelos prejuízos que provocou.
O escritório que representa a empresa, o Teixeira, Martins e Advogados, já está providenciando as petições que encaminharão a decisão ao TJ paulista, ao Superior Tribunal de Justiça e ao Supremo Tribunal Federal, onde outros aspectos da mesma causa estão em apreciação.
A decisão, publicada nesta quinta-feira (3/5), é do juiz Mário Chiuvite Júnior, da 22ª Vara Cível de São Paulo. Com base na perícia, o juiz declarou que a Transbrasil pagara também outras seis notas promissórias cobradas pela GE em processos de execução. O juiz afirma na sentença que ficou provado que a empresa pagou US$ 21,9 milhões para saldar uma dívida total de US$ 19,6 milhões. Ou seja, pagou mais do que devia.
A reviravolta se deve ao fato de o processo de falência ter andado mais rápido que o processo sobre a validade da cobrança, que encalhou em São Paulo — provocando a inadimplência da Companhia.
“A General Electric causou danos enormes à Transbrasil, inviabilizando a Companhia e responderá por isso”, afirma o advogado Roberto Teixeira, para quem a companhia aérea poderia estar voando normalmente, não fosse a cobrança indevida.
A sentença confirma: “Constata-se que o protesto respectivo realizado em detrimento da autora foi indevido, o que certamente acarretou danos a esta última, na forma estabelecida no artigo 1.531 do Código Civil., asseverando-se que tal apontamento indevido causou sérios prejuízos à parte autora, tais como a necessidade de formular a caução respectiva, risco iminente e infundado de ter títulos protestados indevidamente, além de sério abalo de crédito”.
No final, a sentença, além de declarar a inexistência da dívida, também condenou as empresas do Grupo GE “a pagarem à autora, a título de reparação por perdas e danos, nos termos do artigo 1.531 do Código Civil, os prejuízos causados a esta última, valor que deverá ser apurado em liquidação por arbitramento”.
A decisão poderá representar, na prática, a assunção de todas as dívidas da Transbrasil geradas após a paralisação de suas atividades, inclusive trabalhistas e tributárias, pela GE, além de indenização aos acionistas pela derrocada de uma empresa que detinha 20% do mercado, aproximadamente, quando foi requerida a sua falência.
Procurada por meio de sua assessoria de imprensa, a GE afirmou que não foi notificada e não comentou a decisão.
Histórico
As divergências entre as empresas começaram quando um avião operado pela Transbrasil passou por um incidente de aquaplanagem em Porto Alegre. A GE pedia na época que a empresa reconhecesse a perda total da aeronave a fim de poder receber o valor total do seguro. Como a Transbrasil se negou a satisfazer a GE, esta ingressou com o pedido falimentar utilizando-se de um título já pago, além de cobrar outras dívidas igualmente pagas.
A GE também está sendo investigada pela 1ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro por haver votado pela falência da Varig com base em créditos que ela já havia vendido a terceiros. Os seus representantes e advogados, de acordo com manifestação do Ministério Público do Rio de Janeiro existente nesse processo, deverão responder criminalmente pela conduta praticada.
A conduta da GE, no caso da Transbrasil, já foi declarada criminosa durante em relatório final apresentado pela CPI do Banestado.

domingo, 4 de novembro de 2007

Fábrica que empregou Lula pode ir à falência

O prontuário trabalhista do presidente Lula vai ser anexado aos processos de pedido de falência e recuperação judicial da Fris-Moldu-Car, fábrica de frisos de São Bernardo do Campo. Há nove meses, os 270 funcionários da empresa, que deu o primeiro registro ao presidente na década de 60, estão em greve. Os últimos salários foram pagos em dezembro de 2006.

O juiz Gersino Donizete do Prado, da 7ª Vara Cível de São Bernardo do Campo, fez uma inspeção judicial na fábrica no dia 26 de outubro, junto com representantes do Ministério Público, para avaliar pessoalmente a situação da empresa antes de decidir se vai ser decretada a falência ou se a Fris poderá ser recuperada pelos proprietários. Ainda não há previsão para quando deve sair o veredicto.

Prado afirma ser essa a primeira vez que um juiz saiu a campo para fazer uma inspeção. “É uma fábrica histórica de São Bernardo, que já chegou a ter 1.500 trabalhadores, além de ter dado o primeiro emprego com carteira assinada ao atual presidente da República”.

O site www.abcdeluta.org.br traz um depoimento do presidente Lula sobre seu período de 11 meses na Fris. Ele foi demitido por ter se recusado a fazer hora extra. “Eu fui mandado embora porque tinha que fazer hora extra de sábado e domingo e o dono da fábrica dava o dinheiro na sexta-feira, pra gente poder pagar o transporte e poder comer no sábado”. O Sindicato dos Metalúrgicos do ABC pediu a falência da Fris em maio para garantir que a dívida com os trabalhadores, calculada em R$5 milhões, seja honrada.

quarta-feira, 10 de outubro de 2007

Juiz Alexandre Lazzarini comenta a nova Lei de falëncias

Arte de dialogar
Com nova lei de falências, empresário aprende a negociar

por Aline Pinheiro
A nova lei de falências e recuperação judicial (Lei 11.101/05) mal completou dois anos e já mudou hábitos na Justiça e em todo o setor empresarial no país. A legislação trouxe um ensinamento novo para credores e devedores: é preciso dialogar.

A proposta da nova lei é chamar o credor para a sua responsabilidade junto ao devedor e ensinar ambos a negociar. Para o juiz especializado em falências Alexandre Lazzarini, o empresário brasileiro ainda engatinha nessa nova cultura.

Lazzarini é titular da 1ª Vara de Falências da Capital de São Paulo e tem em suas mãos nada menos do que casos como o da Vasp e da Parmalat, filhotes da recém-nascida figura da recuperação judicial, que surgiu com a lei de 2005. A nova figura veio para substituir a antiga concordata. Para Lazzarini, representa uma grande mudança de mentalidade.

Na concordata, explica Lazzarini, prevalecia o comodismo do credor e a ausência de negociação. Na recuperação judicial, o credor ganhou papel mais ativo. A ele cabe analisar se vale mesmo à pena ver a empresa quebrar ou se não é melhor apostar na sua recuperação e negociar para isso.
É essa mudança de mentalidade que Lazzarini acredita que poderá desafogar um pouco o Judiciário. “Quanto mais a empresa dá credito para pessoas sem condição de pagar, mais joga o problema para frente. E, lá na frente, quem vai ter de resolver? O Judiciário.” Se ambos resolverem olhar o problema quando ele surge e aprenderem a negociar, menos processos chegarão à Justiça.

Com seus recém-completados 44 anos, o juiz Alexandre Lazzarini está há pouco tempo no ramo de falências. Até então sua especialidade foi Direito de Família. Neto e filho de desembargador, gosta de ressaltar no seu currículo um fato que, para muitos, poderia ser depreciativo. Mas, para ele, é motivo de orgulho e mostra a isenção familiar na sua carreira na Justiça paulista: foi reprovado no primeiro concurso para juiz. Só entrou para a magistratura na sua segunda investida.

Alexandre Lazzarini falou à revista Consultor Jurídico sobre as mudanças trazidas pela nova lei de falências e recuperação judicial. Também participaram da entrevista os jornalistas Fernando Porfírio e Maurício Cardoso.
Leia a entrevista
ConJur — A nova lei de falências representa uma mudança de mentalidade na forma de tratar empresas em dificuldades?
Alexandre Lazzarini — Sem dúvida. Mas o número de falências ainda é absolutamente maior do que o número de empresas em recuperação judicial. Na 1ª Vara de Falências de São Paulo, onde sou titular, 90% dos processos são de falências e apenas 10% de recuperação judicial.
ConJur — Então onde pode ser vista essa mudança de mentalidade?
Alexandre Lazzarini — Pode ser notada principalmente no surgimento do processo de recuperação judicial. Na época da concordata, o credor era uma figura sem maior expressividade no sistema, embora pudesse pedir a falência da empresa. Hoje, na recuperação judicial, na assembléia de credores, eles têm o poder de decidir o destino da empresa. Embora possa haver motivos jurídicos para pedir a falência da empresa, o credor com visão de mercado pode ver que essa não é a melhor saída, mas sim apostar na empresa. Para os trabalhadores, a empresa é a fonte de renda e, muitas vezes, vale mantê-la.
ConJur — O empresário já se encaixou nessa nova cultura dos negócios?
Alexandre Lazzarini — Ainda está engatinhando. Ainda existe aquela idéia do “você me deve, não me paga e, por isso, não quero nem negociar mais”. E existe também o comodismo do credor, acostumado com a concordata.
ConJur — Qual é o papel do juiz nessa nova cultura?
Alexandre Lazzarini — O juiz tem de analisar os requisitos previstos em lei, não adentrar no mérito da viabilidade econômica da empresa. Ao juiz cabe verificar se as informações prestadas pela empresa estão em ordem ou não. O mérito dessas informações tem de ser analisado pelos credores.
ConJur — Qual a participação do fisco na recuperação judicial?
Alexandre Lazzarini — Os créditos fiscais não estão sujeitos à recuperação judicial. O credor fiscal pode continuar com a execução fiscal, pedindo penhora de bens, ainda que a empresa esteja em processo de recuperação. Por isso é tão importante deixar claro a situação fiscal da empresa antes de começar a recuperação. Muitas vezes, o fisco pode inviabilizar o plano de recuperação.
ConJur — Isso não contraria o objetivo da lei?
Alexandre Lazzarini — Essa é uma das grandes discussões de hoje. A terceira decisão no Brasil dispensando a exigência da Certidão Negativa de Débito para a empresa recuperanda foi minha, mas isso não significa que a empresa esteja dispensada de pagar os tributos atrasados.
ConJur — Se o juiz está à frente de um processo de recuperação judicial e vê que tudo vai bem, mas um credor pede a falência e há motivos jurídicos para decretá-la, ele pode negar?
Alexandre Lazzarini — O artigo 47 da lei de falências fala da função social da empresa. Aí, há argumentos para justificar a rejeição do pedido de falência. É algo complexo que não dá para fixar uma regra. Os casos têm de ser analisados individualmente.
ConJur — O senhor disse que 90% dos processos que tramitam na sua vara são pedidos de falência. Isso é uma opção dos credores ou há dificuldade de aceitar a recuperação judicial?
Alexandre Lazzarini — É incapacidade de entrar em uma recuperação. O processo de recuperação é multidisciplinar. Costumo dizer que é um processo negocial e empresarial. Tem muito pouco de jurídico nisso. A lei dá as diretrizes apenas. Quando o faturamento da empresa começa a cair, em geral, o empresário põe a culpa no excesso de tributação, nos juros bancários, mas não olha, por exemplo, que o produto que fabrica está deixando de ser útil no mercado. Ele só vai notar isso e começar a repensar a empresa quando já estiver com os títulos protestados. Nesta altura, já está sem credibilidade junto aos credores. Por isso eu digo que a visão do próprio empresário tem de mudar.
ConJur — E os credores?
Alexandre Lazzarini — O credor, ao invés de segurar as pontas quando vê que o devedor não vai conseguir pagar, continua dando crédito. Ele vai dando mais corda.
ConJur — Como essa cultura, que ainda prevalece, afeta o Judiciário?
Alexandre Lazzarini — Tem uma pesquisa da professora Maria Tereza Sadek em que ela fala: “os juízes trabalham muito, mas é o mesmo que enxugar gelo”. Quanto mais a empresa dá credito para pessoas sem condição de pagar, mais joga o problema para frente. E, lá na frente, quem vai ter de resolver? O Judiciário. O acúmulo de processos leva à demora nos julgamentos. Com essa demora, acaba virando um negócio válido entrar com uma contestação de cobranças, sejam cobranças devidas ou indevidas. Ou seja, essa briga entre credor e devedor sobrecarrega o Judiciário. Quem se aproveita disso é o mau pagador.
ConJur — A nova lei de falências estimula a negociação e tende a aliviar um pouco o Judiciário?
Alexandre Lazzarini — A lei trouxe o estímulo à negociação, mas precisamos aprender a negociar. Pela antiga lei de falências, o simples fato de o devedor procurar o credor para tentar negociar a dívida já era motivo para pedir a falência. Isso não existe mais hoje. O devedor, hoje, tem liberdade para procurar o credor para negociar. Outro ponto da nova lei importante para reduzir o número de pedidos de falências é a fixação de valor mínimo da dívida. Antes, tínhamos pedidos por dívidas de R$ 700. Hoje, tem de ser, pelo menos, 40 salários mínimos. Essa foi a principal causa da redução brutal na quantidade de pedidos de falências. Reduziu em 90%, mais ou menos, mas a proporção entre processos de falência e recuperação judicial permanece a mesma: 90% e 10%, como eu disse antes.
ConJur — Por que 40 salários mínimos?
Alexandre Lazzarini — Foi uma opção legislativa. Mostra que se começa a discutir a utilidade do processo. Às vezes, por exemplo, pode-se gastar um valor mais alto movendo a máquina judiciária do que o valor da dívida protestada. Esse valor mínimo fixado não impede, evidentemente, que credores formem um consórcio e atinjam os 40 salários mínimos para pedir a falência da empresa pela impontualidade, que é o não pagamento da dívida no dia previsto.
ConJur — Quais são os motivos mais comuns para se pedir a falência de uma empresa?
Alexandre Lazzarini — 98% dos pedidos são feitos por causa da impontualidade, que é motivo suficiente para a falência ser decretada. Outra causa de falência é o que chamamos de execução frustrada. É quando, em uma execução de título judicial, o devedor não paga e não nomeia bens a penhora. Há outros casos previstos na lei, como abandonar o estabelecimento de maneira injustificada, começar a se desfazer do patrimônio também sem justificativa ou ainda a alienação do estabelecimento de maneira fraudulenta. Muitas vezes, essas razões para se pedir a falência da empresa são concomitantes, mas pede-se apenas pela impontualidade porque é mais fácil de provar e faz com que todo o processo de falência seja mais rápido.
ConJur — O que é determinante para decidir entre a decretação da falência e a recuperação judicial?
Alexandre Lazzarini — Primeiro, a vontade do devedor. Muitas vezes, o processo começa na recuperação judicial e termina na falência. Um caso que pode ser considerado paradigma disso é o do Grupo Pires, que foi um dos maiores grupos de segurança privada do país. São cinco empresas no grupo. O pedido de recuperação estava em ordem, o plano era factível, mas outras causas começaram a interferir no desenvolvimento das empresas do grupo, que não teve condições de seguir com a recuperação. Então, ele optou por pedir a auto-falência. E foi deferia a continuidade de negócios de três das empresas, que continuam funcionando e, desde a decretação da falência, passaram a ter condição de arcar com todos os encargos trabalhistas e fiscais, e com seus fornecedores. Evidentemente, há um passivo anterior. Mas dali em diante, pelos relatórios que são apresentados, não houve mais atraso de pagamento de salários ou de impostos e as empresas estão fazendo caixa para poder pagar todos os credores.
ConJur — E aí pode ser feito novo pedido de recuperação?
Alexandre Lazzarini — Não. A lei não prevê isso. A falência decretada significa liquidar a empresa. Ela pode ser vendida como uma unidade produtiva em funcionamento, como é o caso das empresas do Grupo Pires, que ainda não foram vendidas. Estamos em processo de avaliação. Se tudo der certo, estarão liquidadas em um ano.
ConJur — Ou seja, nem sempre a falência é a pior saída.
Alexandre Lazzarini — Nem sempre, como no caso do Grupo Pires. Muitas vezes a empresa é viável desde que não tenha passivo.
ConJur — Mas o que é feito com o passivo, nestes casos?
Alexandre Lazzarini — A finalidade é vender a empresa e, com o dinheiro apurado, pagar o passivo.
ConJur — Há, nos processos de falência, uma briga de competência entre a Justiça Cível, a Criminal e a Trabalhista. Como resolver isso?
Alexandre Lazzarini — É preciso entender que o patrimônio do devedor é a garantia de que a dívida contraída será paga. O processo de falência não tem por finalidade dar tratamento diferenciado entre os credores. A idéia é liquidar e pagar os credores de acordo com a ordem de preferência definida em lei. Ou seja, dividir em partes iguais, e não pagar toda a dívida de um e deixar o outro sem nada. Isso não ocorre, por exemplo, num processo individual de um credor. Ele ajuíza a ação e a Justiça manda pagar sem se preocupar com os outros credores. A falência não pode ser assim. Tem de ser mais global. O processo de falência e recuperação judicial tem natureza coletiva.
ConJur — O senhor diz que o patrimônio é justamente a garantia da dívida. No caso, por exemplo, do Banco Santos, o que se questiona criminalmente é justamente a origem desse patrimônio.
Alexandre Lazzarini — Eu não conheço esse processo. Ainda que o patrimônio tenha sido adquirido de maneira fraudulenta, os credores foram lesados. Se houve superfaturamento ou não, isso é outro problema. O patrimônio dever ser usado para pagar os credores.
ConJur — A especialização do Judiciário está tornando mais célere a efetiva aplicação da Justiça na área de falências?
Alexandre Lazzarini — Por enquanto, sim. Pelo menos aqui na capital de São Paulo. Isso assusta um pouco os devedores, porque as decretações de falência estão vindo muito mais rápido do que antigamente. Antes, credor e devedor usavam a demora da Justiça para tentar negociar. Hoje, quando vão ver, a falência já foi decretada.
ConJur — Quer dizer, não é mais possível usar o Judiciário como meio de pressão.
Alexandre Lazzarini — Aqui na capital, não. Pelo menos, por enquanto. Mas é preciso cuidar com o aumento do movimento nas únicas duas varas especializadas de São Paulo.
ConJur — Por quantos processos o senhor é responsável hoje?
Alexandre Lazzarini — São 800 processos. Só que, por exemplo, só no processo da Vasp há cerca de 2,5 mil atos. Imagine só! E isso não é contabilizado nas estatísticas. As varas de falências de São Paulo não têm juiz auxiliar e estamos pedindo para que tenham.
ConJur — O senhor disse que o processo de falência ou recuperação da empresa é multidisciplinar. Na sua vara, há técnicos para auxiliá-lo?
Alexandre Lazzarini — Não, apenas escreventes. Quando preciso de um serviço especializado, eu tenho que pedir um perito.
ConJur — Seria útil ter uma equipe de consultores para auxiliá-lo?
Alexandre Lazzarini — Eu acho que sim. Em vez de eu ter que nomear um contador para me dizer se as informações que constam da petição inicial estão contabilmente em ordem, eu poderia pedir para um funcionário meu.
ConJur — Vamos falar de casos concretos. O caso da Varig e da Vasp são tão diferentes para as duas terem tratamentos tão diversos?
Alexandre Lazzarini — Não. O tratamento das duas é quase igual. A única diferença é que a Varig continua operando na sua atividade mais vistosa que é voar. A Vasp continua operando, mas só na parte de manutenção. Nos dois casos, buscou-se preservar a unidade produtiva. Duas empresas já manifestaram interesse pela Vasp. Lá, há ainda aproximadamente 300 trabalhadores.
ConJur — Existe possibilidade de a Vasp voltar a voar?
Alexandre Lazzarini — Eu acredito que sim, desde que seja vendida. É preciso que entre um investidor para ela voltar a voar.
ConJur — O caso da Parmalat é um bom exemplo de recuperação?
Alexandre Lazzarini — Da Parmalat Alimentos Operacional, eu acredito que sim. Já a Parmalat Holding está com problemas. Já teve dois planos de recuperação rejeitados. Eu também acho a Varig exemplo de sucesso, aos trancos e barrancos.

Revista Consultor Jurídico, 7 de outubro de 2007